Feitiços e Filmes – Universo da encruzilhada

Praça dos Sonhos

São Bernardo do Campo sempre apresentou cenários perfeitos para meus sonhos de infância. A cidade vibrava com vida, mas meu refúgio especial sempre foi a pracinha ao lado da escola XXXXXXXXXX. Ali, cercado por árvores frondosas e bancos antigos, eu, Diogo, passava horas mergulhado nos gibis do Super Homem e outros heróis. Imaginava-me como deles, um herói, capaz de enfrentar qualquer desafio, mesmo que fosse apenas em minha imaginação.

Lembro-me de um dia em particular, quando estava sentado em meu banco favorito, devorando mais uma edição formatinho da abril do maravilhoso mix DC2000, com o Homem Animal e seu Evangelho do Coiote. O sol filtrava-se pelas folhas das árvores, criando sombras dançantes no chão. Era uma tarde tranquila, perfeita para se perder nas aventuras de um super-herói.

— Ei, Diogo! — uma voz familiar interrompeu minha concentração.

Levantei os olhos e vi Ana, minha melhor amiga, se aproximando. Seus olhos brilhavam com entusiasmo, e ela carregava uma sacola cheia de lanches.

— Trouxe sanduíches e suco — ela disse, sentando-se ao meu lado. — Vamos fazer um piquenique?

Sorri, guardando meu gibi. Ana sempre tinha essa energia contagiante que fazia qualquer dia comum parecer especial.

— Claro! — respondi. — Mano, como um cara escreve um bagulho assim? Olha, parece que ele pulou do desenho do Papa-Léguas pro mundo real! Mundo real do gibi claro. É foda demais!

Ela riu, pegando um sanduíche da sacola.

— Estou pronta para ouvir. Você sempre conta essas histórias de um jeito que até eu me sinto parte delas.

Enquanto comíamos, eu dizia:

— Imagina só: a parada começa com o coiote todo zuado, como se fosse real, numa bad vibe pesada, todo machucado e tem um caminhoneiro que acha que ele é tipo um demônio ou lobisomen e a menina que ele dá carona e aí o coiote entrega um pergaminho e o Final, e quebra a quarta parede de certa maneira. Meu vc tem que ler isso!

Ana ouvia atentamente, ocasionalmente fazendo perguntas e comentários. Nossa amizade era assim: simples, mas profunda. Compartilhávamos nossos sonhos e aventuras, construindo uma conexão que eu sabia ser especial.

— Sabe, Ana — eu disse, olhando para o céu azul acima de nós —, um dia, quero ser um herói de verdade. Alguém que faz a diferença na vida das pessoas.

Ela sorriu, pegando minha mão.

— Você já é um herói para mim, Diogo. E tenho certeza de que fará grandes coisas um dia.

O Ritual dos Filmes

As tardes no parque eram mágicas, mas nossas sextas-feiras à noite tinham um encanto próprio. Toda semana, Ana e eu tínhamos um ritual: assistir filmes juntos na casa dela. Era nosso momento especial, longe das preocupações do mundo exterior.

Naquela sexta-feira, Ana havia escolhido um filme diferente. Ela estava empolgada quando me encontrou na porta de sua casa, segurando a fita de “Jovens Bruxas”.

— Diogo, você tem que ver este filme! — ela exclamou, puxando-me para dentro. — É sobre magia, amizade e desafios. Acho que você vai adorar. Eu vi no cinema e quero rever com você.

Sentei-me no sofá, enquanto Ana preparava pipoca na cozinha. O cheiro delicioso logo encheu a sala, e ela voltou com uma tigela cheia, sentando-se ao meu lado.

— Pronto? — ela perguntou, com um brilho nos olhos.

— Bora! — respondi, ansioso.

O filme começou, e logo fomos transportados para um mundo de mistério e magia. A história das quatro jovens amigas que descobriam seus poderes e enfrentavam seus próprios demônios de maneira destrambelhada como qualquer adolescente ressoava profundamente em nós. Eu podia ver a fascinação nos olhos de Ana, refletindo a minha própria.

— Diogo, imagina se a gente tivesse poderes assim — Ana disse em um momento, os olhos fixos na tela. — O que você faria?

Pensei por um momento, sorrindo.

— Acho que usaria meus poderes para ajudar as pessoas. E você?

Ela riu, jogando um pouco de pipoca em mim.

— Eu não sei… talvez eu faria um feitiço para que nossos sonhos se tornassem realidade.

Assistimos ao filme até o fim, sentindo uma conexão ainda mais forte. A magia da história parecia ter se infiltrado em nossa amizade, tornando-a ainda mais especial.

Quando os créditos começaram a rolar, olhei para Ana e sorri.

— Sabe, Ana, acho que já temos um pouco dessa magia em nossas vidas.

Ela sorriu de volta, segurando minha mão.

— Sim, Diogo. Acho que temos.

Esses momentos, simples e mágicos, moldaram a base de nossa amizade e amor. Cada filme, cada tarde no parque, cada conversa profunda eram tijolos que construíam algo maior. E mesmo sem saber o que o futuro nos reservava, eu sabia que esses momentos seriam eternos em meu coração.

Amores e Segredos

Uma Sombra Invisível

O {{burnout}} passou e nossa amizade se transformou em algo mais profundo. Eu e Ana nos apaixonamos intensamente, uma paixão que parecia ser eterna. Lembro-me de uma noite específica quando, adolescentes, estávamos sentados nas escadarias do colégio, envoltos em uma conversa íntima.

— Diogo, você se lembra daquele gibi do Demolidor, “A Queda de Murdock”? — Ana perguntou, sua voz suave cortando o silêncio da noite.

Assenti, lembrando-me vividamente da história. — Claro, Ana. Como esquecer? Matt Murdock, tão sozinho, que ligava para um serviço que dizia as horas, só para ouvir uma voz humana. Isso sempre me marcou.

Ana olhou para o céu estrelado, seus olhos refletindo a luz das estrelas. — Às vezes, me sinto como ele, sabe? Sozinha, mesmo estando cercada de pessoas.

Segurei sua mão, tentando confortá-la. — Eu também, Ana. Mas quando estou com você, sinto que não estou mais sozinho.

Esses momentos eram preciosos, mas havia uma sombra invisível que pairava sobre nós. Os pais de Ana, membros de uma antiga confraria de alfaiates, tinham expectativas rígidas. Eles queriam que ela se casasse com alguém de status elevado, alguém que trouxesse prestígio à família. Eu, com meu trabalho como analista de suporte, nunca seria aceito por eles.

A mãe de Ana, em particular, parecia determinada a nos separar. Seu olhar sempre carregava uma mistura de desdém e desaprovação. Era como se ela pudesse ver através de mim, julgando cada aspecto da minha existência.

Desaprovação e Mistério

Os encontros com os pais de Ana eram sempre tensos. Certa vez, estávamos jantando na casa dela, e a conversa inevitavelmente se voltou para o futuro de Ana.

— Ana, querida, você deve pensar no seu futuro com seriedade — disse sua mãe, os olhos perfurando os meus. — Precisa se casar com alguém que possa garantir um bom status e segurança.

Ana suspirou, tentando manter a calma. — Mãe, eu amo o Diogo. Ele pode não ser um homem de status, mas tem um coração enorme e me faz feliz.

Seu pai apenas balançou a cabeça, em desaprovação silenciosa. A tensão na sala era palpável, e eu sentia que havia mais do que simples desaprovação por trás daqueles olhares. A verdade, como descobri mais tarde, era muito mais sombria.

Meses se passaram, e a relação com os pais de Ana só piorava. Havia uma frieza crescente em suas interações comigo, uma sensação de que algo estava sendo planejado pelas minhas costas. Uma noite, após uma discussão particularmente intensa, Ana e eu fomos caminhar pelo parque.

— Diogo, tenho que te contar algo — disse Ana, sua voz baixa e hesitante.

— O que foi, Ana? — perguntei, preocupado.

Ela parou, me olhando nos olhos. — Minha mãe… ela fez algo. Ela acredita que você não é bom o suficiente para mim e está disposta a usar todos os meios possíveis para nos separar.

— O que você quer dizer com “todos os meios possíveis”? — perguntei, a ansiedade crescendo dentro de mim.

Ana respirou fundo, hesitando antes de responder. — Ela recorreu à magia, Diogo. Um feitiço para um Exu Caveira. Ela acredita que isso nos afastará para sempre.

Fiquei em choque, sem saber como reagir. Magia? Feitiços? Tudo isso parecia absurdo, mas a seriedade nos olhos de Ana me dizia que ela acreditava piamente no que estava dizendo.

— E você, Ana? Acredita nisso? — perguntei, tentando processar a informação.

Ela segurou minha mão com força. — Não sei no que acreditar, Diogo. Mas sinto que estamos cada vez mais distantes, a cada dia nos afastando, e isso me assusta.

O Feitiço e a Separação

Na noite de Ano Novo, a represa de São Bernardo do Campo estava cheia de vida. As pessoas riam, conversavam e aguardavam ansiosamente o espetáculo de fogos de artifício que anunciaria a chegada de um novo ano. Eu e Ana estávamos no meio da multidão, mas a alegria ao nosso redor contrastava com a tensão silenciosa que pairava entre nós.

Enquanto os primeiros fogos iluminavam o céu, Ana se aproximou de mim. Seus olhos estavam marejados, e ela parecia lutar para encontrar as palavras certas.

— Diogo, precisamos conversar — disse ela, a voz tremendo.

Meu coração apertou. Sabia que algo estava errado, mas não esperava o que viria a seguir.

— O que foi, Ana? — perguntei, tentando esconder meu nervosismo.

Ela respirou fundo, tentando controlar as lágrimas. — Não podemos continuar. Conversei com minha mãe, acho que ela tem razão… ela recebeu uma mensagem, eu acho melhor nós… O Exu ele…

Fiquei em silêncio por um momento, tentando processar o que ela havia dito. Magia novamente? A ideia parecia absurda, mas a seriedade nos olhos de Ana me fez perceber que ela acreditava piamente nisso.

— Magia de novo meu? O que você quer dizer com isso, Ana? — perguntei, incrédulo.

Ana olhou para o chão, evitando meu olhar. — A mensagem do Exu Caveira dizia que não era pra ser. Minha mãe acredita que ela faz sentido, e a maneira como estamos distantes, não sei… sinto que é real, e não sei como lutar contra isso.

As palavras dela cortaram-me como uma lâmina. A ideia de que uma força invisível estava nos separando era aterrorizante, mas a dor em seus olhos era real.

— Ana, eu não acredito em magia. Mas acredito no que sinto por você. Não podemos deixar isso nos separar — disse, segurando sua mão com firmeza.

Ela balançou a cabeça, as lágrimas finalmente escorrendo pelo rosto. — Eu também te amo, Diogo. Mas essa força é real para mim. E está me corroendo por dentro.

Nos separamos naquela noite, sob a luz dos fogos de artifício que explodiam no céu. A multidão ao nosso redor comemorava a chegada do novo ano, mas para mim, o mundo desabava. Perdi não só meu amor, mas também minha melhor amiga. Acreditava que o feitiço havia funcionado, que estávamos destinados a nos separar.

A dor foi insuportável. Passei dias e noites mergulhado em uma escuridão que parecia inescapável. A crença de que a magia havia nos separado me perseguia, tornando impossível encontrar paz.

Encruzilhada

Foi um período de profunda tristeza e solidão. Perdi o contato com Ana e, com ela, uma parte essencial de mim mesmo. Mas, mesmo nas profundezas do desespero, uma pequena chama de esperança persistia. Continuei a estudar, aprender com o Exu e outras entidades, aprendi que ele é o guardião dos cemitérios, o senhor das encruzilhadas, aquele que protege e guia as almas. Ele não era uma força de separação, mas sim de transição e transformação.

No início, era difícil aceitar essa visão. A figura de Exu Caveira sempre me parecia sombria e ameaçadora, uma entidade que havia destruído meu relacionamento com Ana. Mas, à medida que mergulhava mais profundamente nas histórias e nas crenças que cercavam essa entidade, comecei a perceber algo diferente. Exu Caveira não era o vilão da minha história, mas uma representação das mudanças inevitáveis e das transições necessárias na vida.

Lentamente, essa compreensão trouxe uma nova perspectiva. Em vez de ver Exu Caveira como o responsável pela minha desgraça, comecei a vê-lo como um guia através das minhas próprias encruzilhadas. Ele me ensinou que a vida é feita de ciclos, de mortes e renascimentos constantes. Não era um carrasco, mas um mestre que me mostrava o caminho através da escuridão.

E, finalmente, essa mudança de perspectiva trouxe paz ao meu coração. Aceitei que a separação de Ana fazia parte do meu caminho, e que eu precisava encontrar meu próprio renascimento. Com essa nova visão, pude deixar o passado para trás e me abrir para novas possibilidades, para novos amores e novas histórias.

Não sabia como, mas tinha que encontrar uma maneira de superar aquela escuridão. E essa esperança, eventualmente, me levaria a um novo começo. Mesmo assim a dúvida de eu ser bom o suficiente permanecia e crescia. Se eu perdi alguém que me ama não sou digno de ser amado?

E veio o TOC

Depois da separação, a vida perdeu sua cor e significado. Os dias passavam em uma monotonia esmagadora, e as noites eram assombradas por pensamentos que eu não conseguia controlar. A dor da perda de Ana foi apenas o começo. Logo, fui consumido por algo ainda mais insidioso e aterrorizante: o Transtorno Obsessivo-Compulsivo, ou TOC.

Passei a viver sob o peso da dúvida, uma constante sensação de incerteza que me corroía por dentro. O TOC é conhecido como a doença da dúvida, e essa definição nunca me pareceu tão verdadeira. Minha mente estava presa em um ciclo interminável de questionamentos e incertezas. Cada decisão, por mais simples que fosse, transformava-se em um campo minado de possibilidades e consequências aterrorizantes.

Tudo começou com pensamentos intrusivos que surgiam do nada. Eram pensamentos repugnantes, imagens que me causavam náuseas e medo. No início, tentei ignorá-los, mas eles se tornaram cada vez mais frequentes e perturbadores. Não compreendia o que estava acontecendo comigo. Era como se uma sombra invisível tivesse se apoderado da minha mente.

A ansiedade se tornou minha companheira constante. Cada pensamento obscuro trazia uma onda de pânico, e eu me via incapaz de escapar. Passei a evitar lugares e situações que antes eram comuns para mim, temendo que esses pensamentos sombrios tomassem conta de mim. A praça onde costumava me encontrar com Ana, os cinemas, até mesmo minha própria casa se tornaram armadilhas de ansiedade.

— Diogo, você está bem? — perguntou minha mãe certa vez, preocupada com meu comportamento cada vez mais recluso.

Eu apenas balancei a cabeça, incapaz de explicar a batalha que travava dentro de mim. Como poderia explicar algo que nem eu mesmo entendia?

Isolado do mundo, mergulhei em minha própria mente, tentando encontrar respostas. Pesquisei sobre TOC, tentando entender o que estava acontecendo comigo. Descobri que não estava sozinho, que outras pessoas também lutavam contra pensamentos intrusivos e obsessivos. Saber disso tornava a luta um pouco mais fácil.

— Você precisa de ajuda, Diogo — disse um amigo próximo, tentando me fazer sair de casa. — Não pode enfrentar isso sozinho.

Eu sabia que ele estava certo, mas a vergonha e o medo me impediam de buscar ajuda. Sentia-me fraco, incapaz de controlar minha própria mente. A crença de que a magia nos havia separado, que um feitiço estava me destruindo, só agravava a situação. Era como lutar contra um inimigo invisível, uma força que não podia ver nem entender.

Cada dia era uma batalha. Acordava com a esperança de que os pensamentos repugnantes fossem embora, mas eles sempre voltavam, mais fortes do que nunca. Sentia-me prisioneiro de minha própria mente, e a depressão se instalou profundamente. As coisas que antes me traziam alegria — os quadrinhos, os filmes, até mesmo os amigos — pareciam distantes e inatingíveis.

A escuridão dentro de mim era avassaladora, e eu não via saída. Mas, em algum lugar dentro de mim, uma pequena chama de esperança ainda persistia. Sabia que precisava encontrar uma maneira de superar aquela escuridão. E essa esperança, por menor que fosse, me daria a força para continuar lutando, dia após dia.

Foi durante esse período sombrio que comecei a refletir mais profundamente sobre o que havia acontecido. A princípio, a separação de Ana e o feitiço feito por sua mãe pareciam ser a raiz de todos os meus problemas. Mas, ao me aprofundar na minha própria mente e buscar ajuda profissional, comecei a perceber algo mais profundo.

O diagnóstico de TOC trouxe clareza. Compreendi que minha mente estava criando armadilhas de dúvida e medo que me impediam de seguir em frente. Foi então que comecei a ver um paralelo entre minha condição e as encruzilhadas que Exu Caveira simbolizava. As encruzilhadas, na sua essência, são lugares de escolha e mudança, onde cada decisão pode levar a um destino diferente.

Minha vida estava em uma constante encruzilhada mental, paralisada pelo medo de fazer a escolha errada. Mas, aos poucos, entendi que as encruzilhadas não são apenas lugares de tormento, mas também de potencial transformação. Cada escolha, por mais assustadora que fosse, representava uma oportunidade de crescimento e mudança.

A influência de Exu Caveira começou a fazer sentido para mim de uma forma mais sutil. Ele representava a aceitação da incerteza e a coragem de fazer escolhas, mesmo quando o caminho à frente não era claro. Essa nova visão não curou meu TOC, mas me deu ferramentas para enfrentá-lo, assim como a Terapia Cognitivo Comportamenta e o Mindfullness. Não se tratava de eliminar a dúvida, mas de aprender a viver com ela.

Gradualmente, encontrei paz em meio à dúvida. Percebi que não precisava ter todas as respostas, mas sim a coragem de tomar decisões e seguir em frente. A verdadeira força estava em aceitar a incerteza e usar a dúvida como uma bússola para encontrar meu caminho. Foi essa compreensão que me permitiu começar a superar a escuridão e buscar uma nova luz na minha vida.

Essa nova perspectiva me ajudou a entender que as encruzilhadas, tanto na vida quanto na mente, são lugares de poder e potencial. Com isso, comecei a encontrar meu próprio caminho, aceitando a dúvida como parte da jornada e usando-a para guiar minhas escolhas em direção a um futuro mais brilhante.

O Renascimento

Foi então que Jennifer entrou na minha vida. Conhecemo-nos em um evento literário, uma tarde ensolarada que prometia ser apenas mais um dia de tentativa de fuga da minha própria mente. Eu estava imerso em um canto, folheando um livro, quando ouvi uma voz suave ao meu lado.

— Também gosta de Philip K. Dick? — perguntou ela, um sorriso gentil no rosto.

Levantei os olhos e vi Jennifer pela primeira vez. Havia algo em seu olhar que me transmitia uma paz inesperada. Conversamos por horas, sobre livros, filmes e a vida. Pela primeira vez em muito tempo, senti que alguém me compreendia.

Jennifer foi a luz que eu precisava naquele momento. Sua compreensão e paciência deram-me nova esperança. Ela não me julgava, não me via como uma pessoa quebrada, mas como alguém que precisava de apoio e amor. Aos poucos, com seu apoio, comecei a enfrentar meus demônios.

— Diogo, seus pensamentos são apenas isso: pensamentos. Eles não te definem — disse Jennifer, segurando minha mão com firmeza.

Seus olhos transmitiam uma sinceridade que eu não conseguia ignorar. Comecei a acreditar nela. Com sua ajuda, passei a entender que meus pensamentos intrusivos não eram uma maldição, mas parte de uma condição que podia ser gerenciada.

Jennifer me incentivou a buscar ajuda profissional. Comecei a fazer terapia e, aos poucos, a névoa que cobria minha mente começou a dissipar-se. Foi um processo longo e doloroso, mas com Jennifer ao meu lado, senti que podia enfrentar qualquer coisa.

Uma noite, estávamos assistindo a “Jovens Bruxas”. Eu hesitei em revisitar aquele filme, temendo as lembranças dolorosas que ele poderia trazer. Mas Jennifer estava comigo, e sua presença me deu coragem.

— Você consegue, Diogo. Estou aqui com você — disse ela, apertando minha mão.

Enquanto o filme passava, as memórias voltaram, mas desta vez não senti o peso do feitiço. Pela primeira vez em anos, consegui ver aquele momento da minha adolescência sem sentir que estava amaldiçoado. A presença de Jennifer transformou a dor em algo mais suave, algo que eu podia enfrentar.

Foi então que decidi que era hora de contar minha história. Queria transformar minha dor em algo significativo, algo que pudesse ajudar outras pessoas. Jennifer me encorajou, e juntos começamos a trabalhar no roteiro do meu filme.

— Sua história merece ser contada, Diogo. Não só por você, mas por todos que lutam contra seus próprios demônios — disse Jennifer, enquanto discutíamos as cenas do filme.

Cada palavra, cada cena, era uma forma de exorcizar meus demônios, de transformar minha experiência em arte. Com Jennifer ao meu lado, sentia-me mais forte do que nunca.

O renascimento não foi um momento único, mas um processo contínuo. Cada dia ao lado de Jennifer era uma nova oportunidade de mostrar que, mesmo em meio à escuridão, é possível encontrar a luz. Juntos, enfrentamos os desafios e celebramos as pequenas vitórias. E, passo a passo, reconstruí minha vida.

Decisão e o Futuro

Com o encorajamento de Jennifer, decidi que era hora de transformar minha história em algo mais. A ideia de fazer um filme sobre minha vida surgiu como uma forma de dar sentido a todas as minhas lutas e vitórias. Queria contar a verdade sobre meu amor por Ana, a dolorosa luta contra o TOC e a nova vida que construí com Jennifer. Era uma forma de transformar minha experiência em arte, de compartilhar minha jornada com o mundo.

— Diogo, sua história é poderosa. Pode ajudar tantas pessoas — disse Jennifer, sua voz cheia de entusiasmo. — Vamos fazer isso juntos.

Sentados à mesa da cozinha, começamos a esboçar o roteiro. Cada cena, cada diálogo era uma viagem ao passado, mas agora eu estava armado com a força e o apoio de Jennifer. Revivi momentos dolorosos, mas também reencontrei momentos de amor e esperança. Cada palavra escrita era um passo rumo à cura.

— Precisamos mostrar como foi difícil, mas também como você encontrou forças para continuar — insistia Jennifer, sempre me desafiando a ser honesto e vulnerável.

Durante o processo, percebi o quanto havia mudado. O Diogo que lutava contra pensamentos sombrios e intrusivos deu lugar a alguém mais forte, mais resiliente. A presença de Jennifer me mostrou que não estava sozinho, e que minha história podia ser uma luz para outros que enfrentam batalhas semelhantes.

— Não é apenas minha história. É nossa história também, Jennifer — disse a ela, reconhecendo o papel crucial que ela desempenhava em minha vida.

Com o roteiro finalizado, buscamos apoio para a produção do filme. Cada passo do processo, desde encontrar uma equipe até escolher os atores, foi uma nova descoberta. Sentia-me mais vivo do que nunca, vendo minha história ganhar forma.

Hoje, sentado na sala de casa ao lado de Jennifer, rodeado por livros e quadrinhos, sinto-me em paz. O passado não tem mais o mesmo peso, e as sombras que antes me assombravam foram dissipadas pela luz do amor e da compreensão. Estou mais feliz do que nunca por poder compartilhar minha história.

O filme está em produção, e cada dia é uma nova oportunidade de mostrar que, mesmo em meio à escuridão, é possível encontrar a luz. Jennifer e eu olhamos para o futuro com esperança, sabendo que juntos podemos enfrentar qualquer coisa.

Enquanto assistimos ao pôr do sol através da janela, sinto-me grato por cada momento que me trouxe até aqui. A história de Diogo e Ana, a luta contra o TOC, e o renascimento ao lado de Jennifer são partes de um todo que agora posso abraçar completamente.

— Conseguimos, Diogo — diz Jennifer, segurando minha mão.

— Sim Jen — respondo, sorrindo.

A vida, com todas as suas dores e alegrias, transformou-se em uma jornada de autodescoberta e amor. E, sentado ao lado de Jennifer, sei que este é apenas o começo de muitas novas histórias que ainda estão por vir.

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